Eu quase nunca escrevo os textos que gostaria, pensei em escrever vários sobre os filmes do SEMCine e, agora, parece que devo alguma coisa ao mundo. No entanto, pensando bem, não é este o meu trabalho e já disseminei bastante conversando com vários sobre o que vi, além de escrever Godard no meu twitter, depois de ter visto alguns dos seus filmes. Como o bom assunto faz durar a conversa, vou riscar algumas linhas sobre “O Desprezo”.
Na manhã de ontem, vi "O Desprezo", que, enquanto via, já me trazia a clara noção do que significava o termo obra-prima na arte. "O Desprezo" também me fez acreditar que Godard discorre por um caminho de compreensão poética que, para atingir sua potencialidade, necessita encontrar eco na experiência pessoal dos que assistem a seus filmes. Isso é comum quando se trata de arte, mas, para mim, sempre se revelou em maior ou menor grau. Assim como Tchekhov, identifiquei em Godard esta característica em grau amplamente elevado. São muitas e profundas as camadas do humano e para alcançá-las é preciso vivência e bastante atenção. Neste contexto, esclareço que esta vivência não significa idade. A idade pode ser um facilitador, já que uma pessoa mais velha, teoricamente, já teve mais oportunidades para experimentar certas sensações e situações, mas certamente o tempo de vida não é o único caminho tanto pelo fato de que certas experiências não estão profundamente atreladas à idade como pelo fato de que a experiência intelectual, advinda do contato com outras obras de arte, servem como veículo condutor para a compreensão destes níveis.
"O Desprezo" me encantou pela profundidade e unidade entre o discurso poético - sinestésico, semântico e objetivo - e a forma estética imagética, intensa e ininterrupta. Depois do filme, pensei que uma obra-prima é aquilo que se identifica como único e definitivo. De fato, eu não imagino que exista uma forma melhor para se contar aquela história e não acho que alguém possa ir mais fundo na construção de um relato sobre o aquilo. Uma obra-prima: tudo que eu vir sobre o tema daqui para frente, ainda que seja profundamente sincero, para mim será uma derivação de Godard.
Um comentário:
é... ver "infelizmente para/por(?) mim" me provou que o significado de uma obra não está nela ou dentro dela, mas sim entre ela e quem a observa. a obra de arte não é um "em-si", mas um "entre-mundos". um lugar de encontro, a obra de arte é invisível.
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