quinta-feira, 30 de julho de 2009

abrigo

eu sei, mas não entendo como, nem porque acontece. e a gente vai embora, meio sem ter o que deixar para trás, esquecendo tudo lá, quase igual, no mesmo lugar. mas a gente só é o lugar que a gente mora por dentro. e não tem outro jeito, a gente vai embora. vai ouvindo a batida baixa e lenta do coração variado triste e aprumado em busca de novo lar.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

SIM...

Nos amávamos rodando pelo espaço e éramos uma bolinha de carne saborosa e suculenta, uma única bolinha quente que resplandecia e jorrava aromas e vapores enquanto dava voltas e voltas pelo espaço infinito e rodando caía, suavemente caía, até parar no fundo de uma grande salada. E lá ficávamos, aquela bolinha que éramos ela e eu; e lá no fundo da salada víamos o céu e as estrelas que andavam navegando no mais distante da noite.
E de repente éramos a promessa de tudo.
Éramos o certo e justo.
Éramos o esperado anseio do sim.
Éramos o sim.

Eduardo Galeano, título desconhecido.
Texto que me coube como ponto de partida para o trabalho da oficina
com Ronaldo Serruya, integrante do Grupo XIX de teatro/SP.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Se a minha terça fosse começar agora, eu desejaria...

- não doer de saudade.
- tomar um voltaren.
- sentar para beber um cappucino.
- ir no shopping comprar poesia.
- descumprir a minha promessa de trabalhar de madrugada.
- ouvir outras músicas.
- não tocar em meu telefone.
- ter meia hora de consciência livre.

a parte que me cabe nesse latifúndio

vou sair para comprar umas coisas. isto é raro, mas acontece. mas, estive pensando, é prático conquistar as coisas através do dinheiro. pena que nem sempre se tem... é certo, vou voltar para casa com a parte que me cabe nesse latifúndio.

talvez eu fique mais consumista
talvez coloque um piercing
talvez não fale
talvez escolha uma tatuagem
talvez acenda um cigarro
talvez volte a comer carne
talvez não ame mais gente
talvez dê mais esmola
talvez ligue a tv
talvez fique com medo
talvez largue a internet
talvez tome mais remédios
talvez não queira
talvez não me importe
talvez não use livros
talvez não use perfume
talvez pare de fazer teatro
talvez me separe
talvez acenda outro cigarro
talvez use meu DRT de jornalista
talvez pare de tomar café
talvez não conheça ninguém
talvez não escreva
talvez não mude minha respiração
talvez volte para o yôga
talvez não engravide
talvez dance com quem me convidar
talvez eu vá
talvez não volte
talvez vá sempre ao cinema
talvez não faça
talvez não falte

segunda-feira, 27 de julho de 2009

irregular

nos dias sem som e sem silêncio, sempre sinto um desejo de jejuar, mas não é grave.
privar-me requer muita força de vontade.
e, além do mais, tenho medo de ficar santa.
Ainda sobre isto, semana passada testei meu yôga.
já esta semana, talvez, não dê para ir lá,
e nas semanas seguintes é possível que já não encontre mais o caminho.
acontece.
como se eu não soubesse os números que levam o 8 ao 80.
eu, tão antes, esqueço rápido. mudo tanto e não mudo nada.

(...)

Isto assim não pode ser... Mas como achar um remédio? --- Pra acabar este intermédio Lembrei-me de endoidecer: O que era fácil --- partindo Os móveis do meu hotel, Ou para a rua saindo De barrete de papel A gritar <>... Mas a minha Alma, em verdade, Não merece tal façanha, Tal prova de lealdade... Vou deixá-la --- decidido --- No lavabo dum Café, Como um anel esquecido. É um fim mais raffiné.

Serradura, de Mário de Sá-Carneiro, por quem me apaixonei.

visita

às vezes, sinto uma tristeza profunda, arreigada.
ela não me impede de continuar.

poesia


vi um anúncio de papel colado no poste "procura-se Poesia". abaixo da frase, a foto de uma cadela, desde já com cara de abandono, abraçada por uma criança sorridente e sem dente. era mesmo de dar pena, de cortar o coração... resmunguei inultilmente comigo: ô Poesia, aonde você foi parar?

domingo, 26 de julho de 2009

Álcool


Guilhotinas, pelouros e castelos
Resvalam longemente em procissão;
Volteiam-me crepúsculos amarelos,
Mordidos, doentios de roxidão.

Batem asas de auréola aos meus ouvidos,
Grifam-me sons de cor e de perfumes,
Ferem-me os olhos turbilhões de gumes,
Descem-me a alma, sangram-me os sentidos.

Respiro-me no ar que ao longe vem,
Da luz que me ilumina participo;
Quero reunir-me, e todo me dissipo ---
Luto, estrebucho... Em vão! Silvo pra além...

Corro em volta de mim sem me encontrar...
Tudo oscila e se abate como espuma...
Um disco de oiro surge a voltear...
Fecho os meus olhos com pavor da bruma...

Que droga foi a que me inoculei?
Ópio de inferno em vez de paraíso?...
Que sortilégio a mim próprio lancei?
Como é que em dor genial eu me eternizo?

Nem ópio nem morfina. O que me ardeu,
Foi álcool mais raro e penetrante:
É só de mim que ando delirante ---
Manhã tão forte que me anoiteceu.

Uma homenagem a Mário de Sá Carneiro que, como um amigo, me fez companhia num dia transbordante.

um dia humano como shakespeare

- cheguei, ofélia!
- então... eu o amo, hamlet!
- estás bêbeda, ofélia?
- não, meu amor... diga-me embriagada. bêbeda só é adjetivo dos que não têm poesia.

despir ou qualquer coisa que me leve ao fim




quero, num abraço, a nossa paixão em silêncio.
quero um abraço e a nossa paixão no silêncio.
quero chegar enfim.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

sobre estar a salvo

queria estar pisando pela primeira vez em um país estranho, com idioma totalmente incompreensível na escrita e na fala. eu me dirigiria para o pequeno lugar que teria alugado, pela internet por 3 anos com pagamento adiantado, de alguém que eu nunca conhecesse e que, sem nenhuma explicação, entendesse isso perfeitamente. lá eu ficaria apenas lendo até o dia em que, sem perceber, morreria de fome.

eu só quero personagens, leio e entendo,
eles só existem a partir de mim e eu não os temo em nada.

quinta-feira, 23 de julho de 2009


às vezes, tenho medo do tamanho do meu SIM.


sim, cotidiano.


Indo para uma reunião que me deu a oportunidade de ver a orla da Barra até o finzinho da Pituba (é bom viver nessa Bahia, viu?), me impressiono com a secura da maré. Pedras, pedras, pedras... e eu pensei "não é a praia da minha infância", não sei se com desdém ou com amor mesmo. Avisto no calçadão do meu amado bairro, o ex-namorado - o que entrou para a minha história como o último antes do meu estado civil deixar de ser solteira para sempre. Estado civil é coisa que não regride, hein? Só avança ou, com sorte e/ou azar, estaca. Então, ele estava andando com uma menina que, segundo minha memória palpita, deve ser a filha dele. Ele, acho, não casou e ainda é meu vizinho, mora (desde sempre) na esquina mais próxima do prédio onde (coincidentemente) fui morar quando casei. Eu passo praticamente todos os dias pela rua dele, mas a gente se vê menos que quase nunca. Isso para mim é, ao mesmo tempo, estranho e absolutamente natural. Afinal, pensando bem foi quase sempre assim. Eu tive (bem) poucos "namorados" e, do passado, restou apenas um amigo, além deste ex que, pelo menos, sei que está vivo. Os outros simplesmente desapareceram da mesma forma que apareceram. Eu realmente acho estranho sempre que a vida me lembra que os namorados se esquecem, mas acontece muito e com muita gente.

Umas duas horas antes do meu casamento, André me ligou para avisar que não ia poder ir. Eu não cheguei a vê-lo quando deixei o convite, uns dois meses antes, na portaria do prédio. Eu casei no Fórum Ruy Barbosa, às 11 horas da quarta-feira 18 de setembro, em 2002, depois de dormir às 3 da manhã, só, na minha nova casa. Este é o telefonema que mais me recordo de André. Não durou 5 minutos e não houve sentimentalismo.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

juntando tudo no mesmo post

- tenho adorado usar perfume.
- hoje, tive uma prova externa de que eu estou hormonalmente desequilibrada. eu não sei quanto a você, cara leitora, mas a mim homônios desequilibrados assustam e envaidecem.
- fiz uma busca pela palavra paixão no meu blog.
- continuo ouvindo Adriana Calcanhoto e daqui a pouco é capaz que eu vá parar em Djavan...
- minha ansiedade hoje está falando pelos cotovelos (melhor do que quando ela chora em silêncio).
- sempre que quero emagrecer dois quilos, acabo engordando dois. hoje, isto me pareceu significativo e eu ainda não sei o que fazer.
- realmente não é da minha natureza resolver as coisas, mas de vez em quando respiro fundo e faço.
- acordei, num grande esforço, com a frase "eu faço sampa e amor até mais tarde e tenho muito sono de manhã" cantarolando na minha cabeça. essa música me lembra uma pessoa, essa pessoa me lembra todas as outras...
- percebi que escrevi sampa ao invés de samba. deixa aí, faz sentido.
- meu cachorro dorme lindo.
- estou com vontade de dormir em alguém (o contrário também poderia ser).
- enfim, meio-dia.

vai chegar a hora em que nada mais haverá
e eu vou continuar
(eu vou continuar triste)

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Veio para o blog porque nos 140 do twitter não deu não!

Hoje, tive a infelicidade de descobrir a existência da bizarrice "O troco, hein". Coisa que não sei como definir, já que não me parece uma banda e sim um bando de filhos do cão ou de alguma chocadeira vagabunda. Condensados na parca figura do vocalista, ou imbecil com o microfone na mão, promovem em suas festinhas de quinta uma avacalhação da imagem da mulher, degradada como um objeto sexual de baixíssimo valor. Infelizmente, elas aceitam, expondo seus corpos sem nenhuma estima e submetendo-se ao macho no comando. Não sei que mulheres são essas, se são pagas ou não para se vender nos vídeos dos celulares, colocados a, no máximo, meio metro das suas bundas, e conquistar infinitos cliques de fama no Youtube, mas lamento. Lamento a ignorância dessa gente que não sei em qual repertório de valores morais e/ou sociais sobrevivem. Longe de mim representar o conservadorismo comportamental, mas tem limite, pelo amor de Deus, que tenha limite! Eu não vou colocar link, se quiser ver com seus próprios olhos, vá atrás na rede. Deste já, sinto-me obrigada à advertir-lhe: é bizarro e você não precisa conhecer isso para nada em sua vida, alias você será melhor e mais feliz se não conhecer. Eu só escrevi porque não tive outro jeito de me livrar e, sinceramente, lamento também.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

re-visita


O caminho das linhas das nossas mãos sem começo nem fim
Ouvir com os olhos dá ao coração tato
Cada canto de mim é um lugar de ser
Para enrolar meu coração, a brisa tem que ser fresca
Sonhos são árvores que crescem



pelas e para as meninas da oficina "Doralinas e Marias",
trechos da nossa experimentação.

verbete

- latência poderia designar terra molhada.
- impulssível é o nome da frequente dor que sinto do meio para o canto esquerdo do peito.

não posso necessitar
necessitar dói.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

para o dia em que for embora

sei de mulheres que amam ao longe. soube de uma que, cansada da espera, pegou um barco e desceu o rio. ela entendia de remar. às vezes, a gente esquece que pensa que remar é coisa de homem. mas eu. eu entendo pouco de remo, ainda não tenho muita força no braço. remo um pouco, paro, deixo a correnteza me ajustar. a correnteza, sim, tem muita força.

se tem uma coisa que a mim impressiona é água. seja por saber que há muito de água no mundo e que há muito de água no corpo. seja pela sabedoria divina que é existir água doce e existir água salgada. seja pelo poder que ela tem de ser chuva e de guardar-se debaixo da terra; seja pela imensa certeza com que elas em uma se misturam. eu gosto de água. e sou.

no dia em que eu for embora, quero a licença das águas. vou num dia que quero, por todos os céus, o sol. mas, se por bem, o tempo me mandar em chuva, eu em paz também vou. vou até em lágrimas, molhando-me de água companheira.

segunda-feira, 13 de julho de 2009


"pedra é quase planta, planta é quase bicho, bicho é quase gente"


Ouvido ontem de "Jeremias, o profeta da chuva".
Texto e direção Adelice Souza.
Montagem TCA.Núcleo 2009.

domingo, 12 de julho de 2009

sem lenço, sem documento

coisa boa não precisar
hoje tarde mar vento céu azul
nada me foi necessário
nada me pareceu preciso
esqueci a pressa
saltei do mundo
sentei na grama
perdi a cabeça
qualquer lugar

sábado, 11 de julho de 2009

ode à beleza

esta semana vi um menino lindo
lindo lindo céu azul

tomara Deus a sua beleza não suma, não des-, não pereça.
a beleza é uma coisa que me deixa feliz. e salva.

leve

Não me leve a mal
Me leve à toa pela última vez
A um quiosque, ao planetário
Ao cais do porto, ao paço

O meu coração, meu coração
Meu coração parece que perde um pedaço, mas não
Me leve a sério
Passou este verão
Outros passarão
Eu passo

Não se atire do terraço, não arranque minha cabeça
Da sua cortiça
Não beba muita cachaça, não se esqueça depressa de mim, sim?
Pense que eu cheguei de leve
Machuquei você de leve
E me retirei com pés de lã
Sei que o seu caminho amanhã
Será um caminho bom
Mas não me leve

Não me leve a mal
Me leve apenas para andar por aí
Na lagoa, no cemitério
Na areia, no mormaço

O meu coração, meu coração
Meu coração parece que perde um pedaço, mas não
Me leve a sério
Passou este verão
Outros passarão
Eu passo

Não se atire do terraço, não arranque minha cabeça
Da sua cortiça
Não beba muita cachaça, não se esqueça depressa de mim, sim?
Pense que eu cheguei de leve
Machuquei você de leve
E me retirei com pés de lã
Sei que o seu caminho amanhã
Será tudo de bom
Mas não me leve

O meu coração parece que perde um pedaço, mas não
Me leve a sério
Passou este verão
Outros passarão
Eu passo

Carlinhos Vergueiro e Chico Buarque em Carioca

segunda-feira, 6 de julho de 2009

sábado, 4 de julho de 2009

um mobile carrocel
girando, mexendo, bailando sobre o meu rosto
eu, do berço, me encanto e sorrio para os teus cavalos
cavalinhos coloridos, pequenos pôneis, azuis, roxos, verdes, amarelos
eu, em pleno berço, nem mãe, nem menina, nem mulher
sou como o passado,
já não existo.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

ao grande Amor

Sonho.
Como eu queria furacão, tempestade, tsunâmi, terremoto... uma catástrofe natural qualquer de que, nós dois humanos, para sempre carregássemos a culpa. mas não.
Estávamos inocentes deitados na rede da varanda. foi só vento frio na passagem. uma janela aberta. vento frio na nossa noite. a displicência da porta encostada. vento esfriando o café e os pratos de almoço e janta. era só uma catástrofe final para que o passado parecesse vil e nós, a quatro novos olhos abertos, redesenhassemos com independentes cores o bom futuro e outrem. tudo no mundo para a verdade única acabar e sermos para sempre falsos brilhantes de um dourado anel. mas não.
Foi o incomum e calmo. rio acima, mar abaixo. lágrimas quentes de apenas dor de fim. dor de suicídio. esquenta a retina, o nariz. incha, transborda e não passa. lágrima que vai queimando a pele caminho com uma insistência morna, deslizante e erosiva.
É para sempre o sorriso pleno do passado. chegou antes. foi-se cedo. porque não quando fôssemos velhos? envelhecemos. será que isso se repete? será que poderemos ter dois do melhor? e se nós tivéssemos visto antes, quando lá de cima, sem pretensão, éramos os únicos e mais felizes e tudo o que não se podia explicar e só compreender? e se cair das nuvens fosse sempre como água em chuva torrente e nunca um descuido ao se virar e dar com as costas no chão do quarto, ao lado da cama...
És tu, a tristeza no fundo dos meus olhos e será. toda a água aprisionada em meu corpo, por detrás da minha pele, em temperatura regular. eu nunca mais vou olhar nos olhos de ninguém. vou desviar do caminho que te descubra.
Vai você, subindo o rio.
Vou eu, de encontro ao mar.
Andemos. andemos. andemos.

Que Deus nos ajude no silêncio.